Tempestade

Existe algo de desconcertante no céu que antecede uma tempestade, no vento frio que parece levar a cada momento um pouco da máscara colocada para a vida diária, na desconexão com si mesmo quando o pôr do sol acontece antes do previsto, por trás não do horizonte, mas de nuvens escuras e intimidadoras que vão aos poucos ocupando todo o pequeno espaço de céu que os edifícios ao redor me permitem ver.

As estrelas estão ali, eu sei, invisíveis por trás daquelas nuvens tempestuosas.

Não que elas fossem muito visíveis quando o céu está limpo, visto que a luz da cidade insiste em ofuscá-las, porém, sem as nuvens é possível através de seus brilhos longínquos ter um pequeno gosto da liberdade e do universo ao nosso redor.

Mas não em uma tempestade.

Quando a tempestade me intimida o suficiente eu viro as costas para a janela, de forma a ver o interior da minha moradia, e não há surpresa em ver que não há ninguém ali.

O apartamento é um grande vão, sem divisórias, uma tentativa de aumentar o espaço de forma a tornar mais aceitável o absurdo preço pelo metro quadrado nessa cidade tão fria quanto a tempestade que se formava fora da janela. No lado esquerdo está encostada na parede uma televisão de LED, 32 polegadas utilizadas exclusivamente para Netflix, salvo raras excursões ao querido youtube. Do lado oposto da sala, encostado na outra parede, um colchão jogado no chão e algumas almofadas com estampas de filmes clássicos faziam papel de cama e de sofá.

Ao fundo está a minha cozinha subutilizada que possui apenas um armário e uma mesa de duas cadeiras, uma delas ocupada até a altura do seu encosto com caixas de fastfood vazias, quase como que exibindo o fato de nunca ninguém nunca ocupá-la.

Aqui eu durmo, trabalho e sobrevivo.

Da mesma forma vivem uma grande maioria dos jovens que se arriscaram a viver por conta própria, que foram contra a corrente, que conseguiram sua educação, seu emprego, seu lugar para viver e junto disso tudo receberam de presente a maior realidade da vida em uma capital, a solidão.

Não sei o nome dos vizinhos, nenhum deles parece disposto a dizer quando os encontro.

É fácil se ver pensando na sua família, a quilômetros de distância, muitos quilômetros.

É fácil se ver pensando nos amigos, imaginando quantos estão se sentindo como você, pensando em quão melhor você se sente com eles.

É fácil se ver desejando se conectar a alguém, e falhando miseravelmente.

Alguns esparsos sons secos de impacto me levaram a olhar novamente para a janela, e percebi que a anunciada tempestade havia chegado, ela registrava sua aparição com gotas de chuva que serpenteavam pelo vidro sem pressa, ou motivo para isso.

As gotas parecem querer dizer mais do que eu estou disposto, do que eu sou capaz, de ouvir.

Related posts:

I am getting a 1971 vw bus, $8500 was how much I payed, a/b student in a college prep school, all honors classes, 16 year old male, live in florida, have not recieved my license yet and am in 10th…

During our last story, Shaundrika made Rick promise her two weeks of paid vacation in the Bahamas. My guess was Robert, the twins, and she was already there, basking in the sun and drinking rum…

When my liberal father, a retired history professor, read about The Lincoln Project, he pronounced, “I think I’m going to give them money.” To clarify, for my father that means like $100. Yet, this…